Medronho, meu amigo, parece-me que já não acredito em revoluções. Acredito em água mole em pedra dura, tanto dá até que (espero) fura.
O pragmatismo e a observação do resultado de muitas tentativas de concretização de utopias em séculos anteriores levam-me a este simples desalento, no qual reside ainda alguma esperança. Penso ter a obrigação moral de continuar a fazer os possíveis para que o mundo seja melhor, no que estiver ao meu alcance, mas pouco mais. Há utopias lindíssimas com que sonho, e tu sabe-lo. Mas tenho consciência de que o barro de que somos feitos nos impede de voar mais alto.
A evolução, apesar de tudo, tem sido bem rápida, basta pensarmos que, na Europa (ressalve-se), há não muito tempo as mulheres não votavam, Oscar Wilde foi preso pelas suas orientações sexuais, as crianças trabalhavam duramente no mesmo tipo de trabalhos que um adulto, os pobres não tinham outra perspectiva a não ser a da servidão, os negros eram escravos ou vítimas de apartheid. Mas há ainda um vasto mundo onde tudo isto ainda não chegou, quer porque não se consegue fazer cumprir as leis, onde elas existem, quer porque ainda não chegaram, como tu e eu certamente gostaríamos, a todos os sítios onde alguém é oprimido por ser quem é.
Água mole em pedra dura é, neste momento, a única revolução que vislumbro. E, convenhamos, se for sendo feita todos os dias já não é nada mau.
terça-feira, março 28, 2006
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2 comentários:
Tens TODA a razão no que escreves. No entanto gostaria de dizer que cada vez me custa mais olhar em redor. Custa-me ler/ver/ouvir que durante um século e meio "lutamos" para que os males que falas fossem abolidos (não em toda a parte infelizmente), e neste momento estamos a "andar" pra trás. E as pessoas não se apercebem, ou não querem. O marasmo e a apatia tomou conta de toda a gente. o mais importante é o EGO. é o dia a dia (não aquele do Carpe Diem, este sim vale a pena :))). Que fazer? é a questão. Quando vejo as notícias de França fico a pensar se não estamos à beira de uma sociedade podre. Um sociedade à beira de um ataque de nervos. Onde tudo pode acontecer. Basta um rastilho para explodir. Não sei para onde vamos. Nem tão pouco o que queremos (sociedade global). O que sei, é que algo nos falta. Mas o quê?
(as utopias são boas formas de lutar por algo. é algo que nos dá força extra. não cruzemos os braços!)
Primeiro comentário ao teu:
Dizes que estamos a andar para trás, compreendo por que o dizes. A nossa ânsia de que o mundo seja melhor é tão grande, aquilo em que acreditamos parece tão fácil de concretizar e nós já nos esforçamos quotidianamente por que se concretize, que nos dá a impressão que recuamos em ver de avançar, quando olhamos para as outras vidas.
Porém, creio que a nossa fasquia é que está desajustada, somos uns líricos, é o que é. Temos ideais utópicos e não queremos cruzar os braços, mas há que ser realista: com sorte, não mudamos o mundo, mudamo-nos a nós próprios um bocadinho e a alguns como nós. Poque cada ser humano só ouve e entende aquilo que está preparado para ouvir e entender.
A grande trabalheira utópica é aumentar essa capacidade de percepção do mundo, como acontece com a mãe do livro que me emprestaste. Lentamente, ela vai compreendendo que aquilo que ouve não são só palavras, mas caminhos novos. E a vida dela nunca mais é a mesma, bastou assimilar como justas aquelas ideias belas e o mundo mudou, para ela.
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